domingo, 3 de maio de 2015

«Brumas e Escarpas» #88

Mateus Pires e Rolinho das Ovelhas

Na Fajã Grande, como em todas as outras freguesias das Flores e das restantes ilhas dos Açores, existiam diversíssimos lugares, a maior parte dos quais não habitados, mas alguns deles com nomes muitíssimo interessantes. É o caso, entre muitos outros, de dois lugares da toponímia fajãgrandense: “Mateus Pires” e “Rolinho das Ovelhas”. Como a maioria de muitos outros lugares, estes terão uma pequena história ou lenda relacionada com a origem e razão de ser do seu nome, bem como do motivo ou motivos que os terão originado.

Quanto ao lugar de Mateus Pires, ficava no caminho que ligava a Fontinha aos Lavadouros, mais precisamente integrando um outro lugar, muito maior e mais amplo, chamado Alagoinha. Partindo da Fontinha e Alagoeiro, subindo por aquele caminho em direção aos Lavadouros, a seguir à ladeira do Pico Agudo, começava a Alagoinha. O caminho, no cimo da ladeira, fazia uma curva à esquerda em direção à Rocha, seguindo depois paralelo a esta, para iniciar logo a seguir a descida da ladeira da Alagoinha. Era precisamente neste sítio e junto à Rocha, que existia um pequeno montículo, no meio da enorme planície da Alagoinha, que ficava o lugar chamado Mateus Pires. Tratava-se de um lugar pequeno, formado por duas ou três terras de mato e uma relva, tendo sido claramente originado por uma ribanceira, em tempos muitíssimo recuados, caída da Rocha. Contavam os antigos que andando por ali um homem de nome Mateus Pires, teve o azar de ser colhido pela ribanceira e ficar soterrado debaixo da mesma, nunca mais sendo de lá tirado o seu cadáver, pois a quantidade de entulho caído da rocha era tanta e tal que não havia meios que o permitissem fazer. Dele apenas ficou a memória assinalando com o seu nome aquele lugar: o lugar de Mateus Pires.

O segundo lugar era o Rolinho das Ovelhas, este situado junto ao mar. Tratava-se de uma espécie de pequeno enclave entrincheirado entre a Baia d´Água, a norte, e o Respingadouro, a sul. Por sua vez, a este, o Rolinho das Ovelhas fazia fronteira com o Porto e as Furnas e a oeste com o Oceano Atlântico. A ele tinha-se acesso apenas por um caminho de terra batida e pedregulhos (hoje transformado em marginal) que ficava junto ao mar e ligava o Matadouro ao Areal, passando pelo Campo de Futebol. Uma vez que se situava à beira-mar e sendo um lugar pequeno, uma parte do seu espaço, a que confinava com o mar, era ocupada pelo baixio, enquanto o restante era constituído por terras de lavradio onde se cultivava milho, couves, batata-doce e batata branca. Sendo assim, o estranho nome dado a este lugar teria a sua origem, no que concerne à primeira palavra, no facto de sendo localizado à beira mar haver por ali algum pequeno rolo, ou seja uma parte da zona costeira constituída por pequenas pedras soltas e lisas que com o reboliço das ondas do mar se iam alisando ainda mais e mais umas às outras. Mais difícil de explicar, porém, será o nome “das Ovelhas”. É que nunca por ali terão andado ovelhas a pastar ou a fazer outra coisa qualquer, por um lado porque entre as pedras negras do baixio não havia erva e, por outro, porque os terrenos circundantes nunca foram relvas ou pastagens de ovelhas. Assim a explicação parece ser outra. É que na Fajã a palavra “ovelha” também era usada no sentido figurado, significando neste caso a parte superior ou a crista de um determinado tipo de onda do mar que rebentava em espaços e tempos alternados, formando pequenos amontoados de espuma branca, que se assemelhavam a ovelhas. Assim usava-se a expressão “O mar hoje está pejado de ovelhas” para caracterizar o estado do mar onde predominava aquela ondulação. Provavelmente que este tipo de ondas deveria ter sido, outrora, muito frequente naquela zona da costa e, por essa razão, muito naturalmente se passou a chamar àquele local o “Rolinho das Ovelhas”.


Carlos Fagundes

Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».

Sem comentários: